Nasceu em Itaparica, Bahia, a 23 de janeiro de 1941. Viveu em Sergipe durante a infância. Estudos realizados em Salvador, onde se formou em Direito. Ainda se diplomou em Administração Pública pela Universidade de Califórnia do Sul. Tem-se dedicado ao jornalismo e à literatura.
§ Contos:
- 1974: Vencecavalo e o Outro Povo.
- 1981: Livro de Histórias.
§ Romances:
- 1979: Vila Real;
- 1981: Viva o Povo Brasileiro;
- 1994: O Sorriso do Lagarto.
Ainda publicou um volume de ensaio (Política, 1983) e uma narrativa juvenil (Vida e Paixão de Rondomar, o Cruel, 1983).
Sargento Getúlio
Hum. Quer dizer, eu estou aqui. Sou eu. Para eu ser eu direito, tem que ser com o chefe, porque senão eu era outra coisa, mas eu sou eu e não posso ser outra coisa. Estou ficando velho, devo ter mais de trinta. Devo ter mais de quarenta, possa ser, e reparei uns cabelos brancos na barba já tem muito tempo. Não posso ser outra coisa, quer dizer que eu tenho de fazer as coisas que eu faço direito, porque senão como é que vai ser? O que é que eu vou ser? Não gosto dessa conversa desses homens vir aqui conversar. Se o chefe vem, bom. Se não vem, não sei. Eu sou sargento da Polícia Militar do Estado de Sergipe. Não sou nada, eu sou é Getúlio. Bem que eu queria ver o chefe agora, porque sozinho me canso, tenho que pensar, não entendo as coisas direito. Sou sargento da Polícia Militar do Estado de Sergipe. O que é isso? Fico espiando aqui essa dobra de caqui da gola da farda me espetando o queixo. Eu não sou é nada. Gosto de comer, dormir e fazer as coisas. O que eu não entendo eu não gosto, me canso. Chegasse lá, sentava, historiava e esperava a decisão. Era muito melhor. Assim como está, não sei. Não gosto que o mundo mude, me dá uma agonia, fico sem saber o que fazer. É por isso que eu só posso ter de levar esse traste para Aracaju e entregar. Tem que ser. Depois resolvo as outras coisas e tal. Não sei se esse povo é da Bota Amarela, se querem me acertar, me dar um chá da meia noite aí, se são de confiança. Essa Bota Amarela faz os serviços ligeiro. O homem está na porta, com seu pijama e seu sossego, sentado numa cadeira de vime, chega o pistoleiro: boa-noite desculpe o incômodo, que horas são? E aí, por baixo do subaco mesmo, por dentro do paletó, olhando para o outro lado, mete duas no homem e vai embora no mesmo pé. Não gosto deles, recebem dinheiro para fazer isso, não acho direito. Todos casos, quando os homens chegar, não conheço ninguém e seguro a mão debaixo da mesa, com um negócio apontado por baixo mesmo para a queixada de um. Se embarcar, não embarco só, e não tenho vontade de embarcar agora. Preciso avisar a Amaro. Pode ser uma fuzilaria. Quer ver que o padre me empresta aquela de dois. (...)
ESTÉTICA
Ao contrário dos romances da mesma linhagem escritos na década de 30 (José Lins do Rego e outros), a breve saga do Sargento Getúlio mostra um regionalismo mais terra a terra, ou menos exótico. A ênfase plástica no cenário natural e no folclore cede vez a uma visão quase fotográfica da paisagem nordestina. Daí resulta a sondagem no interior dos protagonistas, que lança mão da primeira pessoa para melhor se tornar verossímil. O sargento é um matuto que vai refletindo em torno da (sua) condição humana à medida que conduz o preso a Aracaju, como se ele próprio se encaminhasse para o seu destino final ou para o desvendamento da sua identidade. Nem se trata do regionalismo ingênuo à maneira de Afonso Arinos ou Valdomiro Silveira, como indica o nome de herói da narrativa e a sua condição de policial militar: ambíguos um e outra, camuflam o empenho dum regionalismo engajado, ou pelo menos crítico. Sincopada, ágil, a linguagem serve bem ao propósito: parecendo brotar diretamente da fala do protagonista, sem intervenção do narrador, não esconde a sua oralidade. Mas nem se esmera na inovação de palavras ou de nexos sintáticos, nem atribui à personagem central uma linguagem escorreita. Nesse meio-termo reside, sem dúvida, uma das linhas de força deste romance hoje incorporado à porção mais validada literatura brasileira dos últimos tempos.
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